O Fracasso das Lideranças Políticas
Publicado em 19/06/2013 por Miguel Vieira Pinto 2 959 visualizaçõesA Grécia foi o primeiro país a cair com a crise na Europa. George Papandreou, antigo primeiro-ministro grego, descreve-nos os momentos mais dramáticos da crise e explica-nos porque é que as lideranças europeias não conseguem travar um problema que ainda está para durar.
Em Junho de 2013, George Papandreou foi orador na conferência TED Global e falou sobre a crise económica europeia e sobretudo, sobre a crise nas lideranças políticas que estão a por em risco a própria democracia.
A Democracia foi inventada na Grécia há milhares de anos. Foi esta inovação política que nos libertou de tiranos ou de sumo-sacerdotes que dominavam o povo e decidiam o seu destino em todas as facetas das suas vidas. Mas a história também nos ensinou que a democracia não é algo de absoluto, ou algo de absolutamente adquirido.
George Papandreou conta, nesta conferência, que desde muito novo se interessou pela política, inspirado pelo pai que liderou um movimento que esteve prestes a fazer a diferença. Em 1967 a campanha estava a correr bem, todos estavam empenhados numa vitória e confiavam que a Grécia iria finalmente sair da estagnação política e social que se encontrava. Mas, uma noite, vários camiões militares pararam em frente à porta de sua casa, soldados arrombaram a porta com violência e encontraram-no no terraço do piso superior. O sargento aponta-lhe uma arma à cabeça e grita: «Diz-me onde está o teu pai ou vais morrer já!» O pai, que estava escondido, aparece de imediato e entrega-se. Foi sumariamente encarcerado, sem acusação e sem julgamento. George e seu pai sobreviveram, mas a democracia não. Sete brutais anos de ditadura com a sua família forçada ao exílio foi o resultado.
Hoje em dia as democracias enfrentam também um momento de verdade.
George Papandreou descreve então um episódio muito particular da sua carreira política. É domingo à noite, no mês Abril de 2010, em Bruxelas, e está George sentado, reunido com os seus homólogos, primeiros-ministros dos vários países da União Europeia. Tinha acabado de ser eleito primeiro-ministro da Grécia, e tinha o infeliz privilégio de comunicar que o deficit Grego de 2009 não teria sido de 6%, como anunciado oficialmente apenas uns dias antes, mas de 15,6%. O deficit era apenas um sintoma dos problemas que a Grécia estava a enfrentar. A realidade é que os mercados já não acreditavam na capacidade da Grécia em fazer face aos seus compromissos e já não estavam dispostos a emprestar dinheiro. O país estava prestes a entrar em incumprimento, era a bancarrota. Nessa reunião tentavam chegar a uma resposta conjunta que acalmasse os mercados e desse tempo ao país para corrigir os problemas estruturais restaurando assim a credibilidade financeira. Mas tempo foi algo que não existiu. Os avanços eram lentos e as negociações difíceis até que alguém disse: «Temos que chegar a um acordo já! Os mercados abrem na Ásia dentro de dez minutos e se, até lá, não tivermos uma resposta, será o pânico.» Desta vez não foram os militares, mas os mercados a encostarem uma arma à cabeça dos responsáveis políticos.
O que se seguiu foram as decisões mais difíceis que um político pode enfrentar: cortes, aumentos de impostos, austeridade,…
O que se percebeu desta primeira resposta à crise é que ninguém, nenhum dos primeiros-ministros presentes naquela sala tinha a experiência de ter passado por uma situação análoga. Ninguém sabia realmente como agir, e foram todos vítimas da sua ignorância colectiva. Foram levados pelos próprios medos.
As nossas democracias estão encurraladas entre sistemas demasiado grandes para poderem ser controlados e demasiado grandes para poderem falhar.
Este tipo de decisões, retirando os cidadãos do processo, invés de construir o processo de decisão à volta dos cidadãos, é a causa do mau funcionamento das democracias. Os cidadãos não se revêm nos políticos, não confiam nos políticos e pensam, de uma forma geral, que estes prestam um péssimo serviço à democracia que prometem defender. Quando a polícia tem que defender o parlamento dos cidadãos é porque algo está profundamente errado nas democracias.
Na altura, George Papandreou disse aos seus colegas europeus que teria que consultar a população grega num referendo sobre as políticas de austeridade. Os colegas europeus disseram de imediato: «Não pode fazer isso! Está a imaginar a reacção dos mercados?» A ideia chave de Papandreou seria que, antes de restaurar a confiança dos mercados precisava de restaurar a confiança da sua população, de outra forma as medidas não seriam possíveis de implementar. Acabou por ser vencido pelo esmagador pensamento dominante.
Na Grécia antiga o local de discussão e deliberação política era a Ágora, que era também o mercado. Os dois locais estavam juntos para que o povo estivesse presente e participasse das decisões comuns.
Vivemos um tempo em que o desemprego jovem atinge 70% nalguns países. É preciso muita falta de imaginação dos decisores políticos para nada fazerem quanto a isto. O foco não está centrado naquilo que verdadeiramente interessa, que são as pessoas, os cidadãos.
Com o envolvimento de todos, num verdadeiro ambiente democrático, e sem a pressão dos “mercados” poderemos chegar a melhores soluções que resolvam, de facto, os problemas das pessoas.
A emissão de Eurobonds, a eleição directa de um presidente europeu, a evolução para uma verdadeira cidadania europeia onde a nossa cultura comum é a democracia, são temas que devem ser discutidos amplamente, com o envolvimento de todos os cidadãos. Só assim os cidadãos se poderão rever nas políticas e um dia, quem sabe, nos políticos.
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